Por: MARIA LUISA ABRANTES
Data: 27 / 03 / 2023
Os indícios de que algo estava a correr mal no cumprimento do plano de reestruturação no Credit Suisse , fundado em 1856, com activos de 796.3 bilhões de francos suíços em 2017 , foram anteriores ao desmoronamento do Silicon Valley Bank e ocasionaram a queda em 25% das suas ações da bolsa Suíça , que provocou a corrida ao banco pelos clientes que sacaram bilhões de dólares . De imediato o CEO do banco , veio a público sossegar os seus investidores e credores , dizendo que o banco estava bem , mas o dano reputacional já tinha dado origem à desconfiança instalada .
Sendo a Suíça o maior hub Financeiro do mundo, qualquer oscilação negativa da banca , influencia o sistema financeiro internacional. Segundo a Deloitte , em 2021 , o valor total do sector bancário na Suíça era de 2,6 trilhões de dólares , o que tem uma grande influência no seu PIB .
Por isso, o Governo suíço interviu de imediato, através do Presidente Suíço , Alan Berset, num domingo ( 17/3/2023), já depois do desmoronamento do Silicon Valley Bank . Berset , anunciou uma ajuda de 50 mil milhões de francos suíços, a compra do referido banco pela sua congênere o UBS , por 1.800.000,00 de euros , uma garantia soberana de 9 mil milhões de francos suíços à UBS e o uma linha de liquidez do Banco Central suíço ao UBS , no valor de 100 mil milhões de francos suíços . Essa comunicação acalmou os ânimos dos parceiros do Crédit Suisse . Todavia , o valor total da transação para a aquisição do Credit Suisse , está avaliado em 3,02 milhões de euros.
Lembremos-nos contudo, que durante a crise do subprime de 2008 , o UBS quase colapsou , por falhas no compliance , só sobrevivendo pelas várias injeções de milhares de milhões de francos suíços do Estado suíço , que lhe volta a injectar mais 100 mil milhões de francos suíços , para proceder à fusão com o Crédit Suisse .
Entretanto , o Crédit Suisse já vinha demonstrado mau desempenho, pelos resultados negativos de 2021 , não tendo sequer conseguido apresentar contas . É preciso não esquecer que estamo-nos a referir a dois dos maiores bancos suíços .
Sendo os bancos suíços considerados pelos investidores, dos bancos mais seguros , pela confiança sustentada num passado recente , pelos apertados controlos dos mesmo , essa confiança após o primeiro sinal de alerta em 2008 no UBS , seu maior banco e agora no Credit Suisse , aventa a possibilidade de contágio , pelo actual risco reputacional elevado .
A desconfiança poderá ter como consequência a deslocalização de capitais , da Suíça para outros paraísos fiscais , cada vez mais procurados , como o Luxemburgo e Singapura , Emirados Árabes, entre outros , o que seria de extrema gravidade para a Suíça , seus clientes e investidores ao nível global . De 2002 a 2021 , o numero de bancos suíços passou de 365 para 239 , com o encerramento de 26 bancos .
Stefan Legge , Chefe da Política Fiscal e comercial do IFF da Universidade de Saint Gallen , questiona a utilização pelo Estado do uso da lei de emergência, para vender o banco sem consultar os seus acionistas , nem comunicar aos detentores de títulos.
No caso do Deutsch Bank , o maior banco alemão, criado em Março, em 1870 , com activos de 1.475 trilhões de euros em 2017 , após a queda do Silicon Valley Bank , do Signature Bank , da necessidade de concessão de liquidez ao First Republic Bank ( foram injectados nos 3 bancos 300 bilhões de dólares , do fundo composto pelos 11 maiores bancos americanos, por empréstimo garantido pelo Estado) e da aquisição do Credit Suisse , a instabilidade do mercado financeiro global , ocasionou uma forte subida no custo dos seguros das dívidas do Deutsh Bank .
A queda das suas ações em bolsa foi inevitável , o que fez soar o alarme e originou a desconfiança por parte dos “stakeholders ” , que recearam os riscos de mercado . Por essa razão , os ” spreads” ( taxa do CDS – credit default swap ) a 5 anos aumentaram , significando que o mercado não tinha confiança na volatilidade do sistema financeiro. Segundo a S&P Global, no dia 20 de Março, os CDS do Deutsh Bank estavam a 142 pontos de base e no dia 22 de Março, os CDS estavam a 208 pontos de base . Os seguros aumentaram da mesma forma para outros bancos .
Não obstante o Deutsh Bank tenha tido um lucro de cerca de 5 bilhões de dólares em 2022 , em 2018 e 2019 , teve prejuízos de 52 milhões de euros e 5,728 milhões de euros respectivamente . O Deutsh Bank , à semelhança do Citigroup , tem tido vários processos relacionados com suspeita de lavagem de dinheiro , através de abertura de contas off shore para alguns clientes e o New Zeland Bank-AZN , era suspeito de manipular os preços relativos à venda das suas ações. Esses eventos está a levar a uma subida da taxa de juros , em vez induzir aos cortes aspirados .
Acresce-se o facto dos bitcoins , cuja crise originou a recente queda do Signature Bank , entre outras instituições regionais, fugirem ao controle dos bancos centrais , porque estes não tem uma regulamentação adequada a essa e outras moedas digitais, embora sejam as únicas instituições autorizadas a cunhar moeda .
A gravidade é tanto maior , quando nos Estados Unidos de América , há uma grande exposição dos bancos ao sector imobiliário e eventuais colapsos no sector imobiliário , causariam como consequência , uma maior pressão aos pequenos e médios bancos. Pior ainda , é que nesse país , cerca de 40% do sector imobiliário compra e vende os imóveis em bitcoins , proveniente de dinheiro lícito , ou fruto de lavagem , sem que a emissão e supervisão seja executada pelos bancos centrais .
Sendo as principais funções dos Bancos Centrais , garantir a estabilidade do sistema financeiro, através da implementação da política monetária e da emissão de moeda adequada ao funcionamento da economia , são estas instituições as únicas que estão investidas do poder de ” imperium ” , que lhes permite exercer o papel
para que foram criadas com autonomia , imparcialidade e compliance , (r)estabelecendo a confiança ao sistema global financeiro .
Porém , ainda que na sequência da queda das ações dos bancos após a queda das bolsas de valores , as decisões dos Bancos Centrais e respectivos Governos , tenham sido comunicadas quase em simultâneo , dizendo estar tudo controlado para aclamar os mercados , a verdade é que não está . O stress dos bancos mencionados , que de momento apenas contagiou ” ilhas ” significativas do sistema financeiro global , pode sim tornar-se sistêmico , se as negociações iniciadas hoje , pela Rússia e a pela Ucrânia na Turquia, não chegarem a bom porto e a guerra que está afectar toda a Europa e seus aliados persistir , provocando uma maior crise de cereais, de gás e de energia.
Por outro lado , se o Silicon Valley contagiaria cerca de 2% do mercado, o Deutsh Bank já poderia contagiar cerca de 20% o mercado financeiro .
NO CASO DE ANGOLA HÁ UM EMPRÉSTIMO NO VALOR DE MIL MILHÕES DE DÓLARES , DOS QUAIS , 200 MILHÕES DE DÓLARES FORAM CONCEDIDOS À EMPRESA PRIVADA CARRINHO , COM GARANTIA DO ESTADO , ( que por incumprimento em em momento de turbulência poderia ser acionada ) , DE UMA FORMA NÃO TRANSPARENTE , pelo que a subida de juros afetará o valor da dívida externa angolana .
Enquanto os Estados Unidos recorrem ao aumento do endividamento externo para resgatar as instituições financeiras e para a compra de títulos da dívida privada , a Europa tende a utilizar o dinheiro público , pago pelo contribuinte para o mesmo fim .
Tratando-se de instituições financeiras privadas , põe-se a questão da justeza da contribuição dupla que os bancos recebem em momentos de dificuldade , seja por más políticas de intervenção dos Estados , seja por gestão danosa , seja por falta de compliance , já que o controlo interno não basta , por ser um exercício incompleto, porque funciona apenas por amostragem .
É que as verbas do Estado são na verdade dos cidadãos, que coercivamente pagam impostos directos e indirectos, sem qualquer retorno e os fundos criados pelos bancos , são na verdade retirados aos depositantes , pagos serviços mínimos cada vez mais caros .
Levanta-se ainda a questão , da legitimidade da oferta de garantias soberanas do Estado , muitas vezes acionadas sem retorno e da intervenção do Estado nos bancos privados falidos , através das nacionalizações ” relâmpago ” ( o terno é meu ) . É que o Estado paga para comprar parte das ações , para pouco tempo depois de alavancar o banco as revender , não poucas vezes , aos anteriores proprietários , ou perdoar grande parte da dívida aos bancos.
Levanta-se também o problema de saber , qual o fundamento para que seja o cidadão comum a pagar a factura pela má gestão dos banqueiros privados , ou pela má gestão de Governos , em vez de serem os mesmos a pagar do seu bolso , deduzindo dos milionários bônus que mesmo tendo prejuízo recebem , alegando com descaramento que é porque consta do contrato .
Nos Estados Unidos da América, só após a crise financeira de 2008, os Presidentes Biden e Obama propuseram a intervenção do Estado na regulação do sistema bancário e a possibilidade de punir os gestores dos bancos , tendo o primeiro iniciado uma luta contra fortes lobbies , pela regulação da banca , que o Presidente Trump desfez . Em Angola , a última lei das instituições financeiras já inclui a responsabilização e sanção individual dos gestores bancários . Quanto à sanção da pessoa colectiva , essa legislação não pode ultrapassar o código penal , que não equipara as sociedades às pessoas singulares , porque para o direito penal, para punir alguém por um delito culposo , é expressamente necessário que a culpa , elemento subjectivo obrigatório no crime , seja claramente tipificada .
No caso de Angola , põe-se ainda a questão de as nacionalizações serem irreversíveis, porém , as ações poderiam voltar para os anteriores proprietários , através de sociedades nacionais de que sejam detentores de ações e de sociedades estrangeiras que detêm nos paraísos fiscais , para onde há anos drenam os recursos cambiais escassos .
HÁ QUE REPENSAR O PAPEL DOS BANCOS CENTRAIS, O FORMATO DO DINHEIRO NUMA ERA DIGITAL E INDEPENDÊNCIA NA ESCOLHA DA MOEDA NAS TRANSAÇÕES COMERCIAIS , E RESPECTIVA REGULAÇÃO .