Por. MARIA LUÍSA ABRANTES
Data: 01 / 05 / 2025
A forma como tem sido anunciada pela comunicação social , a notícia sobre a organização do evento ( Cimeira EUA/Africa ) , a realizar pelo CCA – Corporate Council on Africa em Angola , no mês de Junho próximo em Luanda , presta-se a certa confusão , que poderia ser propositada . Sugere quase , tratar-se de um evento relacionado possivelmente com a Administração Americana .
Como é normal e lógico , sobretudo num país com a dimensão , estatura e desenvolvimento como os Estados Unidos , o Estado protege os seus contribuintes , estimula a inciativa privada e apoia-os nas suas missões no exterior do país , visando a criação de emprego e de riqueza para os americanos ( Americans first ) . Logo , é normal que quer durante a Administração Biden , quer durante a Administração Trump , qualquer actividade que possa resultar em benefício financeiro , para a receita fiscal e para pessoas colectivas ou singulares americanas , (como será o caso da evento do CCA em Angola ) , tem todo o apoio e acompanhamento institucional como deve ser . Por isso , na qualidade de representante da Câmara do Comércio americana , a AMCHAM Angola , também dará o seu contributo a custo zero , mobilizando os seus membros para participarem e para patrocinarem o evento .
O CCA- Corporate Council on Africa , é uma Associação PRIVADA, embora esteja registada como uma organização sem fins lucrativos, criada em 1993 por Stephen Hayes , um ex diplomata americano na altura recém reformado , que tinha cumprido missões em África. Os eventos do CCA , por norma organizavam-se de 2 em 2 anos , com a denominação de “Cimeira EUA/Africa . Estas “Cimeiras ” , funcionam muito mais como elo de ligação entre empresas americanas prestadoras de serviços e “lobbies ” americanos , com membros de Governo Africanos , do que com empresas africanas .
Tendo a clara noção de que nos países africanos existem poucas empresas de transformação , fora dos sectores de extracção geológica e minera , a estratégia do CCA seria , de conseguir convencer os Chefes de Estado africanos e auxiliares do seu Executivo , a assinarem contratos de prestação de serviços e de fornecimento de produtos com empresas americanas vocacionadas para o efeito e com lobistas . A visão seria , a de conseguirem angariar um maior número de membros , se demonstrassem conseguir atrair para os seus eventos , um maior número de Chefes de Estado prioritariamente e de membros do Executivo. A missão seria , fazerem dinheiro para os seus proprietários . Porém , como os Chefes de Estado Africanos não estavam a obter os resultados esperados , nem encontravam nos eventos organizados pelo CCA representantes da Administração americana a sua altura , a sua participação começou a escassear e os auxiliares dos seus Executivos passaram a ser os participantes mais habituais .
É muito normal nos Estados Unidos , como em outros países desenvolvidos , pessoas desempregadas criaram associações e ONGs , com ou sem fins lucrativos ( aparentemente) , porque se os trabalhadores voluntários não auferem salários, os seus dirigentes não raras vezes auferem salários elevados .
O CCA- Corporate Council on Africa tem apenas cerca de 180 membros , (dos quais grande parte são prestadoras de serviço, ONGs e lobistas ) . Esse número de membros , num país com a dimensão dos Estados Unidos é irrisório , comparado com os mais de 3 milhões de membros ( empresas) da Câmara de Comércio Americana . Os Executivos do CCA- Corporate Council on Africa , são pagos regularmente com o lucro dos eventos , realizados com patrocínios avultados de empresas maioritariamente do sector petrolífero , ou suas prestadoras de serviços e adicionalmente , pela venda do ingressos aos participantes , que também não são baratos .
A primeira Cimeira organizada pelo CCA – Corporate Council on Africa , foi em 1997 , em Washington, D.C.. Recordo-me que a delegação angolana convidada , era chefiada pelo economista Madeira Torres , então Secretário para os Assuntos Econômicos da Presidência da República . Entretanto , como não foi efectuado o pagamento no acto da inscrição que confundiram com o registo , não participaram . Estávamos habituados ao facto de que em Angola, quando o Governo angolano organiza ou apoia a organização de qualquer evento , não só não é cobrada a participação aos convidados estrangeiros , como ainda é pago o seu alojamento , a alimentação , o transporte e não raras vezes a deslocação . Isso é surreal , num país sedento de recursos financeiros escassos , para satisfazer o mínimo de condições sociais , de saneamento básico e de infraestruturas . Em 1999 , o 2o. evento do CCA foi realizado em Houston e nela já participaram quer o então PCA da SONANGOL Manuel Vicente , quer o então Ministro da Indústria Joaquim David , ex PCA da SONANGOL .
Nesse evento, o CCA instituiu um prêmio . O primeiro galardoado foi um jovem estudante americano estagiário (voluntário) do CCA . Fiquei chocada , mais propriamente envergonhada , quando o Presidente da organização , entre altas gargalhadas sarcásticas , fez grandes elogios ao jovem estagiário inexperiente , com pouco mais de 20 anos , porque o incumbiu de entregar os convites aos Gabinetes de Chefes de Estado africanos e ele pasmem-se , conseguiu o prodígio de ser recebido não pelo staff dos Presidentes da República , mas pessoalmente pelos próprios Chefes de Estado . Nem sequer o recém criado e recém auto-nomeado Presidente da associação , deu-se ao trabalho de se deslocar . Ora , isso seria de todo impensável nos Estados Unidos da América . Que o diga o Presente João Lourenço . Entre os premiados. , sem razão aparente , estava o Presidente do Gabão Omar Bongo , cuja governação estava conotada com actos de corrupção comprovada e liderava um regime de Partido único , porque a oposição era impedida de exercer o seu papel . Isso só era possível , pelo facto do CCA ser uma Associação com fins unicamente lucrativos , permeável aos patrocinadores que pagam mais .
Sendo o CCA-Corporate Council on Africa uma organização privada , independentemente do grande encaixe financeiro proveniente das receitas dos patrocínios e da venda de ingressos , provavelmente haverá custos adicionais para o Governo angolano , a boa maneira africana . Essa hipótese seria impossível se se tratasse do inverso . Pela minha experiência e conhecimento de ambos os países , tenho sérias reservas sobre os benefícios para o empresariado angolano , porque quem tem tudo e em grande quantidade para vender , não vem investir em Angola , onde não há água potável , nem luz eletricidade , nem mão de obra especializada , nem estradas que possibilitem o rápido escoamento dos produtos , nem divisas disponíveis . Compensaria sim , caso o resultado da referida Cimeira desse origem a novas parcerias “win-win” , que pudessem no mínimo acrescentar valor a alguns dos nossos produtos e proporcionar a transferência de tecnologia , sem a qual o nosso desenvolvimento económico ficará adiado . De resto , todos fornecimentos de bens e de serviços a serem efectuados , seriam com financiamentos com base em garantias bancárias soberanas , ou privadas , ou em créditos ‘a exportação . Todo e qualquer registo de criação de novas empresas , seria sobretudo , com o objetivo de obtenção de licença para repatriamento de capitais , ( ainda antes de finalizar a realização do investimento ) , que pode ser com recurso ao crédito interno e possível isenção parcial ou total de impostos . Maior facilidade , nem na China .
A actual Presidente do CCA Florizelle Liser , foi nomeada , após final do seu mandato e reforma do cargo de Representante para África da USTR ( Gabinete do Representante para o Comércio Exterior dos Estados Unidos) . Nessa capacidade , visitou pela primeira vez Angola em 2014 , se a memória não me falha . Na ocasião , durante um encontro no Ministério do Comércio , apontou as debilidades do nosso país , que dificultavam a implementação da parceria estratégica , que aliás pioraram .